Amizade entre cachorro e criança envolve proteção e vai além da fofura

Maria Clara tem quase dois anos e já aprendeu a dividir, a ter empatia. Manuela, de cinco meses, tem uma protetora especial, de olho em tudo o que faz. São crianças que vivem em cidades diferentes, mas com algo em comum: animal de estimação.

No caso de Maria Clara, o amigão é Chico, ou Francisco Carlos na hora da bronca. O cachorrinho, que foi resgatado machucado na rua, tem entre 4 e 5 anos e era o reizinho da casa quando a menina chegou.

Em rede social, o perfil da duplinha transborda amor. Fotos registram as brincadeiras, descobertas e o carinho entre eles.

É verdade que, às vezes, Chico quer um pouquinho de sossego. Por isso, os dois sempre são monitorados e, quando necessário, um adulto intervém.

A mãe, Nicole Derenzi, afirma que Maria Clara puxou muito pelo do Chico, quando era menorzinha, mas ele foi paciente. Atualmente, quando o cãozinho está incomodado com a abordagem excessiva da irmã humana, sinaliza: sai de perto ou olha para a tutora.

“Não pode deixar sozinhos. Tem que monitorar e perceber como o cachorro está se sentindo e como a criança está se portando. São dois serzinhos cheio de amor, mas que não têm a linha do perigo acesa.”

Nicole diz que foi Chico quem descobriu sua gravidez. Isso porque o cachorro passou a deitar sobre sua barriga —o que não costumava fazer— antes que exames comprovassem a gestação. Desde então, ficou mais apegado e não saiu do seu lado até quando entrou em trabalho de parto.

Com dores, ela andava pela casa à espera das contrações, e Chico caminhava ao seu lado e lambia sua perna. “Era como se dissesse ‘não sei se vou conseguir te ajudar muito, mas eu estou aqui com você’”, afirma

Para que Chico fosse se acostumando com a chegada do bebê, as roupinhas usadas por Maria Clara na maternidade eram diariamente levadas para casa.

“Quando cheguei da maternidade e ele cheirou minha filha, entendeu do que se tratava. Ele saiu correndo pela casa para buscar a touquinha [que havia sido usada pela menina logo após o nascimento]”. Foi um ‘estou entendendo, o cheiro chegou’”, diz.

Uma das fotos publicadas mostra o cãozinho deitado sobre a peça.

A mãe chama o cãozinho de Chico Costner, em referência a Kevin Costner e seu papel no filme “O Guarda-Costas”, e diz que o pet sempre foi muito preocupado com a criança.

De acordo com Nicole, o cãozinho nunca teve seu espaço delimitado pela chegada da criança, assim como não houve restrição de aproximação da menina a ele.

“É comum no Brasil as pessoas largarem seus animais quando engravidam. Não é assim”, diz a mãe, que mora na capital paulista.

Em Santos, no litoral, Doralice, de aproximadamente 3 anos e meio, é a grande protetora da Manuela. A convivência entre elas também é retratada em rede social.

A mãe, Érika Miamoto diz que Doralice não gosta muito que Manu encoste nela, embora seja sua maior defensora.

Para construir uma relação entre as duas, Érika também enviava diariamente para casa as roupinhas usadas pela menina na maternidade.

Quando a irmãzinha humana chegou, Doralice estranhou um pouco, apesar de reconhecer o cheiro. Mas logo tudo mudou.

“Foi questão de minutos. Depois se tornou bem protetora, a ponto de toda vez que a neném chora, se eu não estou no quarto, a primeira a chegar é a Doralice, assim como nosso gato, o Chico”, afirma.

Apesar de extremamente apegada com a tutora, agora a cadela prefere ficar perto de quem estiver com a criança.

“A gente passeia muito na praia. Se minha mãe está com o carrinho [de bebê] na frente, Doralice, que sempre foi apegada comigo, vai atrás do carrinho. Dá preferência para quem está com a neném”, diz.

Para Érika, o convívio é importante para que a criança aprenda que os animais também precisam de carinho e de cuidado. “Ter bichinho de estimação só ensina a ter amor.”

Doralice foi resgatada em uma estrada de terra em Cristais, Minas. O gato Chico também foi adotado das ruas.

“A Manu agora vê a Doralice e começa sorrir. Vê Chico, estica mãozinha”, afirma.

BENEFÍCIOS E CUIDADOS

Segundo estudo divulgado pela Universidade de Cambridge, em colaboração com o Centro de Nutrição e Bem-estar Animal Waltham, da Mars Petcare, animais de estimação têm grande influência no desenvolvimento da criança e impacto positivo nas habilidades sociais e bem-estar emocional.

De acordo com a pesquisa, aqueles que convivem com pets tendem a ter autoestima mais elevada, se sentem menos sozinhos, têm mais habilidades sociais e costumam demonstrar mais empatia com os colegas.

A empresa afirma que, na escola, as pesquisas sinalizam que os animais podem ajudar as crianças a aprender, mantendo-as interessados e motivadas a terem bons comportamentos. Ter um pet na família também traz benefícios para a saúde, como redução do risco de alergias associadas a asma, além de auxiliar crianças que sofrem de transtorno de déficit de atenção.

Apesar dos pontos positivos, ter um animal de estimação implica dedicação e gastos. Como um integrante da família, o bichinho precisa atenção, carinho e cuidados com alimentação, saúde e lazer.

O Brasil tem cerca de 30 milhões de animais abandonados, sendo 20 milhões de cães, segundo dados de 2014 da OMS (Organização Mundial da Saúde). Não há números oficiais mais recentes, mas protetores e ONGs sentem essa estatística engrossar. Por inúmeros motivos, animais são colocados para fora de suas casas diariamente —e alguns adotados, devolvidos aos abrigos.

Antes de adotar um amigão, é preciso avaliar, por exemplo, se ele se encaixa na rotina da família e se o tutor terá tempo suficiente para o bichinho.